Tahia Carioca
Tahia
Carioca foi um dos grandes ícones da Era de Ouro da Dança do Ventre, que
podemos dizer que aconteceu entre 1930 e 1959, aproximadamente. Você pode
encontrar vídeos dessa bailarina espetacular em praticamente qualquer coletânea
de vídeos dessa época, e todos eles valem a pena ser estudados, pois Tahia foi
uma das bailarinas que ficaram conhecidas por elevar o nível técnico da dança
oriental no Egito. Tanto que foi chamada pela revista New York Times como uma
pioneira da dança oriental moderna, isto é, como ela é dançada hoje.
Tahia nasceu
em Ismalia, no Egito, em 1919 como Badaweya Mohamed Kareem Al Nirani. Por conta
de problemas de convivência com sua família, ela fugiu para o Cairo, onde foi
morar com uma antiga vizinha, Souad Mahasen, que era dona de uma casa noturna.
Quando
chegou ao Cairo, Tahia começou a estudar dança na Escola de Dança Ivanova, e
apesar de pedir uma oportunidade para trabalhar na casa noturna de Souad, a sua
vizinha queria impedir que a menina recém chegada de sua cidade natal, e por
quem ela tinha muito carinho, entrasse nesse estilo de vida, que desde sempre
foi considerado de baixíssima reputação. Alguns relatos indicam que Souad
acabou cedendo aos pedidos de Tahia, enquanto outros indicam que apesar de suas
reticências, o rumor da beleza de menina chegou aos ouvidos de Badia Al Masabni, que
ofereceu um lugar para ela dançar na sua famosa Sala.
Independentemente
de como ela chegou à Sala de Badia, quando Tahia começou a trabalhar lá em 1933
o seu nome artístico ainda era Tahia Mohamed, porém, foi justamente nessa época
que uma dança se tornou famosa por conta de um filme do Fred Astaire e Ginger Rogers.
Essa dança tinha como nome Carioca, pois era baseada no trabalho da
luso-brasileira Carmen Miranda, e,claro, que Tahia começou a dança-la, obtendo
um grande sucesso, e foi assim ela ganhou um novo nome artístico: Tahia
Carioca. Mais tarde ela incorporaria passos de danças latinas em suas
performances.
A partir
daí o seu sucesso foi galopante. Tahia começou a trabalhar na indústria do
cinema em 1935, e participou de mais de 120 filmes, sem contar peças de teatro
e programas de televisão, incluindo diversas novelas. Ela era tão famosa que
muitas vezes era chamada de a Marilyn Monroe do Egito (título esse que também
era atribuído a sua contemporânea Samia Gamal). É
importante lembrar que Tahia não só dançava brilhantemente, mas também cantava
e atuava.
O primeiro
filme em que ela aparece como atriz é de 1946 e se chama "Laabet el sitt"("O Fantoche da
Dama") e um dos pontos altos de sua carreira foi o filme "ShababImra" ("A Juventude de uma
mulher"), que foi exibido em Cannes em 1956. Ela chegou a ser chamada para
participar de filmes em Hollywood, mas havia a exigência que ela fizesse aulas
de ballet, pois seus braços foram considerados pouco elaborados, o que ela
teria se recusado a fazer pois ela era uma bailarina profissional e não
precisava de ajuda para dançar. Sendo rejeitados por Tahia, os produtores de
Hollywood fizeram contato com a sua então rival, Samia Gamal, que aceitou a fez
história.
Existem
algumas lendas em torno de Tahia Carioca. Por exemplo, dizem que em 1936 ela
dançou no casamento do Rei Farouk, do Egito (que na época era uma monarquia),
onde dividiu o palco nada menos do que Um Kulthum, que era uma das suas fãs.
Tanto que dizem que Um Kulthum afirmou que Tahia cantava com o seu corpo (olha
aí a leitura musical!). Também existem relatos de que nesse mesmo evento ela
teria dado um tapa no Rei, por ele ter colocado uma pedra de gelo dentro da sua
roupa enquanto ela dançava. De uma forma geral, a relação de Tahia com o Rei
Farouk era complicada, encontram-se relatos de que ela adorava a Rainha Farida,
esposa de Farouk, e só aturava o Rei por conta dela, e que depois que os dois
se divorciaram ela nunca mais teria aceitado nenhum convite dele para dançar,
incluindo um convite para dançar na sua segunda festa de casamento. Quando o
rei faleceu, sua segunda esposa disse a Tahia que ela sabia o quanto ela não
gostava dela, ao qual Tahia teria respondido que sim, não gostava, porque ela
havia trazido má sorte ao Egito ao se casar com o Rei.
Na esfera
pessoal, Tahia acabou por seguir os passos do seu pai, que se casou nada menos
do que 7 vezes, casando-se ela mesma 14 vezes (!!!!!) com diversos atores e
homens de negócios, incluindo um americano que mais tarde também foi casado com
Samia Gamal. Apesar de tantos casamentos, Tahia nunca conseguiu engravidar, o
que era algo que a entristecia, mas em compensação ela dava atenção especial
aos seus sobrinhos, além de ter uma filha adotiva, Atiyat Allah.
Fora das
telas e do palco, Tahia também mantinha uma vida política ativa. Até a
revolução de 52, ela era leal ao Rei Farouk e à Monarquia, tanto que em 1953
chegou a ser presa pelo Nasser (que viria a ser o segundo presidente do Egito
em 1956 e que foi um dos líderes da revolução de 52), que a manteve na prisão
por 110 dias, isso por ela ter expressado em público o seu
desejo de ver a volta do regime anterior.
A partir
de então, Tahia se manteve politicamente ativa na luta pelos direitos dos
egípcios, chegando até mesmo a entrar em greve em 1987, por conta de uma nova
legislação que diminuía os direitos trabalhistas, inclusive dos atores.
Tahia era
famosa entre os egípcios por conseguir ser sedutora sem ser vulgar, e esse tipo
de citação pode ser encontrada em diversas fontes. Até Edward Said (famoso
historiador palestino conhecido por sua obra "Orientalismo") é
mencionado por ter dito certa vez que ela era capaz de ser sedutora sem se
esforçar, sem ser vulgar, que ela era capaz de dominar as autoridades sem
perder a compostura, além da forma franca e direta que era capaz de contar suas
experiências fracassadas com os homens (também, com 14 casamentos, haja
história!).
De certa forma, pode-se dizer que Tahia incorporava diversos traços que os egípcios gostam de ver e com as quais eles se identificam. Ela tinha uma personalidade muito forte, não se deixando dobrar com facilidade, mas sem deixar de ser simpática e encantadora.
Como exemplo disso, existe uma citação dela que diz
"Quando eu dançava, ninguém falava, e nenhum garçom servia nada. Eu
simplesmente não permitia. Certa vez um homem estava falando durante o meu show
em Beirute, e eu bati nele com minha bengala até ele se calar! Hoje em dia as
casas noturnas são muito barulhentas, e as bailarinas vulgares demais. Eu não
aprovo."
Apesar do relacionamento conturbado com seus familiares e
com os fãs egípcios por ela ser bailarina, Tahia foi uma das artistas mais
amadas do Egito. Ela se aposentou da dança 1963, continuando na carreira de
atriz. Quando ficou mais velha, fez a peregrinação a Meca e passou a usar véu,
o que a deu ainda mais credibilidade no Egito. Os egípcios adoram histórias de
bailarinas que se tornam mais religiosas e param de dançar.
Após passar seus últimos 13 anos de vida dedicando-se ao
Islã, ela faleceu em 1999, aos 80 anos, por conta de um ataque cardíaco, e o
seu funeral foi um grande acontecimento público, com a procissão sendo liderada
pelo ministro da cultura da época, Farouk Hosni.
E como não poderia deixar de colocar aqui, Tahia Carioca para o nosso deleite!
E como não poderia deixar de colocar aqui, Tahia Carioca para o nosso deleite!