segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

2ª Parte


Tahia Carioca 


Tahia Carioca foi um dos grandes ícones da Era de Ouro da Dança do Ventre, que podemos dizer que aconteceu entre 1930 e 1959, aproximadamente. Você pode encontrar vídeos dessa bailarina espetacular em praticamente qualquer coletânea de vídeos dessa época, e todos eles valem a pena ser estudados, pois Tahia foi uma das bailarinas que ficaram conhecidas por elevar o nível técnico da dança oriental no Egito. Tanto que foi chamada pela revista New York Times como uma pioneira da dança oriental moderna, isto é, como ela é dançada hoje.

Tahia nasceu em Ismalia, no Egito, em 1919 como Badaweya Mohamed Kareem Al Nirani. Por conta de problemas de convivência com sua família, ela fugiu para o Cairo, onde foi morar com uma antiga vizinha, Souad Mahasen, que era dona de uma casa noturna.

Quando chegou ao Cairo, Tahia começou a estudar dança na Escola de Dança Ivanova, e apesar de pedir uma oportunidade para trabalhar na casa noturna de Souad, a sua vizinha queria impedir que a menina recém chegada de sua cidade natal, e por quem ela tinha muito carinho, entrasse nesse estilo de vida, que desde sempre foi considerado de baixíssima reputação. Alguns relatos indicam que Souad acabou cedendo aos pedidos de Tahia, enquanto outros indicam que apesar de suas reticências, o rumor da beleza de menina chegou aos ouvidos de Badia Al Masabni, que ofereceu um lugar para ela dançar na sua famosa Sala.

Independentemente de como ela chegou à Sala de Badia, quando Tahia começou a trabalhar lá em 1933 o seu nome artístico ainda era Tahia Mohamed, porém, foi justamente nessa época que uma dança se tornou famosa por conta de um filme do Fred Astaire e Ginger Rogers. Essa dança tinha como nome Carioca, pois era baseada no trabalho da luso-brasileira Carmen Miranda, e,claro, que Tahia começou a dança-la, obtendo um grande sucesso, e foi assim ela ganhou um novo nome artístico: Tahia Carioca.  Mais tarde ela incorporaria passos de danças latinas em suas performances.

Tahia Carioca versão Carmen Miranda!

A partir daí o seu sucesso foi galopante. Tahia começou a trabalhar na indústria do cinema em 1935, e participou de mais de 120 filmes, sem contar peças de teatro e programas de televisão, incluindo diversas novelas. Ela era tão famosa que muitas vezes era chamada de a Marilyn Monroe do Egito (título esse que também era atribuído a sua contemporânea Samia Gamal). É importante lembrar que Tahia não só dançava brilhantemente, mas também cantava e atuava.

O primeiro filme em que ela aparece como atriz é de 1946 e se chama "Laabet el sitt"("O Fantoche da Dama") e um dos pontos altos de sua carreira foi o filme "ShababImra" ("A Juventude de uma mulher"), que foi exibido em Cannes em 1956. Ela chegou a ser chamada para participar de filmes em Hollywood, mas havia a exigência que ela fizesse aulas de ballet, pois seus braços foram considerados pouco elaborados, o que ela teria se recusado a fazer pois ela era uma bailarina profissional e não precisava de ajuda para dançar. Sendo rejeitados por Tahia, os produtores de Hollywood fizeram contato com a sua então rival, Samia Gamal, que aceitou a fez história.

Existem algumas lendas em torno de Tahia Carioca. Por exemplo, dizem que em 1936 ela dançou no casamento do Rei Farouk, do Egito (que na época era uma monarquia), onde dividiu o palco nada menos do que Um Kulthum, que era uma das suas fãs. Tanto que dizem que Um Kulthum afirmou que Tahia cantava com o seu corpo (olha aí a leitura musical!). Também existem relatos de que nesse mesmo evento ela teria dado um tapa no Rei, por ele ter colocado uma pedra de gelo dentro da sua roupa enquanto ela dançava. De uma forma geral, a relação de Tahia com o Rei Farouk era complicada, encontram-se relatos de que ela adorava a Rainha Farida, esposa de Farouk, e só aturava o Rei por conta dela, e que depois que os dois se divorciaram ela nunca mais teria aceitado nenhum convite dele para dançar, incluindo um convite para dançar na sua segunda festa de casamento. Quando o rei faleceu, sua segunda esposa disse a Tahia que ela sabia o quanto ela não gostava dela, ao qual Tahia teria respondido que sim, não gostava, porque ela havia trazido má sorte ao Egito ao se casar com o Rei.

Na esfera pessoal, Tahia acabou por seguir os passos do seu pai, que se casou nada menos do que 7 vezes, casando-se ela mesma 14 vezes (!!!!!) com diversos atores e homens de negócios, incluindo um americano que mais tarde também foi casado com Samia Gamal. Apesar de tantos casamentos, Tahia nunca conseguiu engravidar, o que era algo que a entristecia, mas em compensação ela dava atenção especial aos seus sobrinhos, além de ter uma filha adotiva, Atiyat Allah.

Fora das telas e do palco, Tahia também mantinha uma vida política ativa. Até a revolução de 52, ela era leal ao Rei Farouk e à Monarquia, tanto que em 1953 chegou a ser presa pelo Nasser (que viria a ser o segundo presidente do Egito em 1956 e que foi um dos líderes da revolução de 52), que a manteve na prisão por 110 dias, isso por ela ter expressado em público o seu desejo de ver a volta do regime anterior.

A partir de então, Tahia se manteve politicamente ativa na luta pelos direitos dos egípcios, chegando até mesmo a entrar em greve em 1987, por conta de uma nova legislação que diminuía os direitos trabalhistas, inclusive dos atores.

Tahia era famosa entre os egípcios por conseguir ser sedutora sem ser vulgar, e esse tipo de citação pode ser encontrada em diversas fontes. Até Edward Said (famoso historiador palestino conhecido por sua obra "Orientalismo") é mencionado por ter dito certa vez que ela era capaz de ser sedutora sem se esforçar, sem ser vulgar, que ela era capaz de dominar as autoridades sem perder a compostura, além da forma franca e direta que era capaz de contar suas experiências fracassadas com os homens (também, com 14 casamentos, haja história!).


De certa forma, pode-se dizer que Tahia incorporava diversos traços que os egípcios gostam de ver e com as quais eles se identificam. Ela tinha uma personalidade muito forte, não se deixando dobrar com facilidade, mas sem deixar de ser simpática e encantadora.

Como exemplo disso, existe uma citação dela que diz "Quando eu dançava, ninguém falava, e nenhum garçom servia nada. Eu simplesmente não permitia. Certa vez um homem estava falando durante o meu show em Beirute, e eu bati nele com minha bengala até ele se calar! Hoje em dia as casas noturnas são muito barulhentas, e as bailarinas vulgares demais. Eu não aprovo."


Apesar do relacionamento conturbado com seus familiares e com os fãs egípcios por ela ser bailarina, Tahia foi uma das artistas mais amadas do Egito. Ela se aposentou da dança 1963, continuando na carreira de atriz. Quando ficou mais velha, fez a peregrinação a Meca e passou a usar véu, o que a deu ainda mais credibilidade no Egito. Os egípcios adoram histórias de bailarinas que se tornam mais religiosas e param de dançar.



Após passar seus últimos 13 anos de vida dedicando-se ao Islã, ela faleceu em 1999, aos 80 anos, por conta de um ataque cardíaco, e o seu funeral foi um grande acontecimento público, com a procissão sendo liderada pelo ministro da cultura da época, Farouk Hosni.

E como não poderia deixar de colocar aqui, Tahia Carioca para o nosso deleite!



A Era de ouro da dança egípcia: Cassinos e Cinema



No final do século XIX e princípio do XX, temos no Egito uma grande revolução social, acompanhando a revolução industrial que movimentava todo o mundo ocidental. Neste período, o Egito foi social e economicamente dirigido pela Inglaterra, que levou para o Cairo muitos estrangeiros, investidores, arqueólogos e pesquisadores, além de inovações tecnológicas como a fotografia e o cinema.
Neste período, a cena cultural do Cairo muito se desenvolveu a exemplo de como era a própria cena cultural do Rio de Janeiro: Muitos cassinos e casas de espetáculos atraíam não só os estrangeiros, como os próprios egípcios negociantes e residentes na capital.
Neste contexto, surge a primeira das grandes estrelas do cinema egípcio: Badia Massabni, libanesa, cedo deixa o cinema para abrir o famoso Cassino Badia e também o Cassino Ópera do Cairo.
Este foi a mais importante casa dedicada a

espetáculos no Cairo. Por ela passaram grandes estrelas do cinema como, Naima Akef, Tahya Karioca, Samya Gamal, e grandes músicos como Farid Al Atrche, Mohamed Abdel Wahad e Abdul Halim Hafez.
O Cassino foi palco também de diversas companhias ocidentais de dança, que influenciaram também o modo de dançar das egípcias.
O cinema egípcio teve grande importância na divulgação da dança do ventre pelo mundo árabe e foi grandemente divulgada para o ocidente por Hollywood.
Muitas cenas de cinema retratavam o ambiente cultural do Cairo, com suas casas de show e festividades em praça pública. Muitas ainda mostravam cenas de dança em casamentos e também a dança em cenas de casais.
Tecnicamente, vale dizer que a dança sofreu grande transformação neste período. Deixando as casas e as ruas e se elevando ao palco, esta dança precisou também refinar – se e adquirir postura cênica. Novos movimentos foram incluídos na movimentação cênica, inspirados nos movimentos de ballet: o arabesque, a movimentação de braços e giros, que antes não eram executados, tendo no balady popular, a movimentação muito concentrada no quadril.
Desde então, a dança segue seu caminho de evolução, rumo ao refinamento técnico e grandiosidade de espetáculo que podemos apreciar hoje em dia.
Vale a pena estudar e entender a trajetória desta arte no Egito e no mundo ocidental. 

Mahmoud Reda  /  Farida Fahmy

 












Mahmoud Reda é um grande marco da história da dança cênica egípcia. Este grande coreógrafo foi ator e dançarino com grandes participações no cinema e na TV com sua "Reda Trupe" e a primeira bailarina Farida Mahmy.
Não há como falar da história da dança egípcia sem mencionar seu trabalho. Reda "reinventou" a dança popular egípcia, tendo feito pesquisa de movimento e contexto social em diversas áreas do Egito, trazendo ao teatro, cinema e TV muitas coreografias inspiradas na movimentação genuína das tradições populares egípcias, revelando ao próprio egípcio, e ao mundo, sua cultura e sua terra.
Vale dizer que Reda nunca abriu mão de seu próprio estilo, mesmo nas composições folclóricas. Suas coreografias estão recheadas de arabesques, giros, saltos e movimentações refinadas de braços e pernas, que mistura à movimentação típica de cada dança representada.
Foram inventados por ele alguns estilos de dança largamente executados como dança egípcia mundo afora: Melea Laff - representação da antiga mulher alexandrina ou do subúrbio do Cairo, que usava este item tradicional de vestimenta. Não existe uma dança do melea, mas sim a dança cênica que representa este personagem - A mulher egípcia que usa melea.
Mwuashahat - Reda trabalhou sobre um estilo de música muito antigo, mas muito vivo na tradição musical erudita do Egito. Criou muitas peças destinadas à TV e ao teatro. Com vasto vocabulário vindo do balé clássico, este estilo de dança influenciou o que vamos chamar de "Dança Oriental Clássica", reafirmando o papel do balé em uma dança egípcia refinada e de conceito artístico elevado. Pouco trabalho de quadril, muita dinâmica entre os bailarinos e coreografias elaboradas.

Estrelas inesquecíveis



A partir da década de 70, a Dança Egípcia ganha estrelas cada vez mais importantes. Todas grandes dançarinas e estrelas do cinema.



Foi um marco como bailarina e produtora, pois inseriu a Dança nos hotéis 5 estrelas e inovou em termos de figurino, cenário e orquestram transformando o show de dança em espetáculo grandioso.
 


é a dona dos quadris mais poderosos da história da dança do ventre!!! Musa inspiradora, a verdadeira Ma'alimah encarnada, a rainha do baladi! Baladi = Fifi. Esta, decididamente não dançava dança oriental clássica. Estilo de dança altamente popular, até mesmo quando decide dançar um rotina oriental, seu estilo baladi é marcante.
 




Nascida na Alexandria, Egito, Iniciou sua carreira na dança quando era muito jovem, começando  seus trabalhos com grupos folclóricos egípcios se tornando membro famoso do grupo Reda no Cairo, por volta de 1981, tornando se artista amada e que faz sucesso  nos dias atuais.
 





, foi a mais doce das grandes estrelas das décadas de 70 e 80. Foi ela quem inseriu a interpretação dos grandes clássicos de Om Kalsoum  (Tarab) nos espetáculos de dança. Idolatrada até hoje, Suheir Zaki teve uma técnica muito tanto própria e marcante como suave e encantadora.
 




Conhecida pelos Libaneses como bronze do Nilo esta dançarina é dona de um estilo peculiar de dança, transformando cada apresentação em um oásis de interpretação em cena com movimentos perfeitamente delineados por sua  energia e vigor.
 


É lembrada pela ousadia e constante  sede de inovação que se refletiam em seus  trajes com modelos contrários dos que eram da época, além disso , ela foi a primeira a dançar de sapato de salto alto. Além de se dedicar a dança Oriental ela também frequentou outras escola de dança onde aprendeu Samba, Tango , balé e outros. Tanta dedicação aos estudos que foi bem sucedida por cerca de 50 filmes durante sua vida. 
 



Foi a primeira dançarina a  aparecer em numerosos filmes egípcios , oportunizando assim a entrada para outros dançarinos na almejada esfera cinematográfica. Além de ter  se estabelecido na sua época com uma atriz de cinema e estrela, altamente respeitada e aclamada pelo público. Ainda nos dias atuais é reconhecida pelo seu trabalho.
 





É com certeza o marco maior da dança do ventre egípcia atual - sinônimo de popularidade, riqueza e inovação. Seu estilo de dança é tão marcante quanto os figurinos que escolhe para usar. Ela mesma pensa os figurinos, assim como coreografa suas músicas com rigor. Tudo nela é marketing e personalidade. Imitada pelas bailarinas do mundo inteiro, sua técnica é única e sua expressão muito apurada.
 





Da década de 80 surgiu uma das maiores estrelas da dança egípcia ainda atuantes hoje em dia: A lenda viva Lucy - Herdeira da Era de Ouro e dona de seu próprio Cabaré no cairo - em seus vídeos podemos avaliar claramente a mudança que a dança egípcia toma com a globalização, internet e maior presença das bailarinas estrangeiras no Cairo.
 






Grande referência da atualidade, no Egito, Randa Kamel com o crescente radicalismo do Islã dentro do Egito, cada vez menos egípcias dançam, abrindo mercado para as estrangeiras que buscam na terra da dança do ventre, seu caminho profissional. Algumas se tornam famosas e reconhecidas pelo próprio povo egípcio, como a caso de Soraia - Brasileira e Asmahan - Argentina. Muitas outras já trilharam este mesmo caminho como Sahra Saeda - inglesa e Nur - russa.
 

 Samia Gamal    


“Se há alguma coisa que podemos aprender com Samia Gamal, é a “arte do flirt” durante a dança”, afirma Lulu Sabongi. Se você passar algumas horas pesquisando vídeos da bailarina egípcia com certeza reconhecerá esta característica. Zainab Ibrahim Mahfuz nasceu no vilarejo de Wana, em 1924. Assim como outras bailarinas, mudou-se para o Cairo e, anos mais tarde, foi convidada para participar da casa de Badia Masabni. Lá, teve aulas com Jacque, uma professora muito importante e famosa.
Recebeu formação em jazz, ballet, dança contemporânea, moderna e, claro, na dança do ventre. Nesta época, conheceuTahia Carioca, já conhecida no Egito, e daí surgiu uma amizade que duraria a vida toda. Da companheira profissional incorporou giros e deslocamentos do balé, além da influência da dança e música latina. Foi Badia quem a batizou de Samia Gamal.

Mitos e verdades
Samia Gamal é charmosa. O motivo? Está ali em cima, na primeira frase. A bailarina egípcia é famosa pelo olhar sensual, expressivo e penetrante. Não é à toa que no filme “Zannoubia”, o personagem fica completamente hipnotizado por sua dança. Os efeitos especiais da cena só enfatizam a característica. Não faz movimentos exagerados e grandes, faz arabesques e giros. Diferente de outras bailarinas egípcias, utiliza muito os braços.
Hossam Hamzy conta, em um artigo muito interessante sobre a bailarina (em inglês), que ela introduziu o hábito de dançar descalça, antes dela era normal utilizar saltos em espetáculos. Na verdade, tudo começou quando um dos seus sapatos saiu do pé, ou quebrou o salto durante uma apresentação. Ela logo se desvencilhou do outro e continuou com graça, sendo muito aplaudida pela plateia. Dizem que o último rei egípcio, Farouk, afirmou que Samia era a “Bailarina Nacional do Egito”, mas o músico Hossam afirma que a história não passa de um mito e que o rei nunca proclamou publicamente um gosto especial por uma das bailarinas. Afirma-se que Samia utilizava muito o véu em sua dança. Aparentemente, é resultado do treinamento que recebeu da professora Jacque, que usava o acessório para forçar a aluna a melhorar o trabalho com os braços..

Carreira no cinema
Assim como Tahia Carioca, também estrelou diversos filmes (cerca de 80, até o final de sua carreira). O primeiro foi “Gawhara” (1942), quando ela ainda tinha apenas 18 anos. O mais conhecido internacionalmente foi “Ali Baba e os quarenta ladrões” (1954), do diretor francês Jacques Becker. No cinema conheceu o ator e cantor Farid Al Attach, com o qual teve um romance..
Na década de 50, mudou-se para os EUA e foi uma das bailarinas pioneiras na América do Norte. Sua dança influenciou filmes e apresentações musicais nas terras norte-americanas. Quando estava com aproximadamente 50 anos afastou- se da dança, mas a aposentadoria não durou muito. Logo voltou a se apresentar e só parou definitivamente aproximadamente dez anos depois. Ela faleceu em 1994, aos 70 anos.
Algumas músicas usadas pela bailarina em apresentações e filmes foram: Zeina, Zenuba, Raqsat Kahramana (AfritaHanem), Al-Rabia, Habibi Lazmar e Ana Alli Wa Utilu. A música Zeina, do vídeo acima, foi composta por Mohamed Abdel Wahab, e tem como base dois ritmos: o Ayub e o Masmoudi



Bibliografia:


 http://bellymaniacas.com/
https://cadernosdedanca.wordpress.com/